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joao e o pe de feijao

Pergunto-me se hoje em dia as crianças, na escola, ainda fazem experimentos como plantar um feijão em um potinho de iogurte forrado com algodão, para acompanhar o processo da germinação. Talvez possa parecer algo muito simplório, mas décadas depois ainda continuo admirando o milagre de haver uma árvore dentro de uma semente. Não no caso do feijão, é óbvio, porque feijões não nascem em árvores. Infelizmente, não é tão óbvio assim para muita gente.

Enquanto em caminhava com as cachorras, minhas fiéis escudeiras, percebi que logo a minha frente seguia um grupo de estudantes, cujas idades estimei entre 12 a 14 anos, aproximadamente. Rindo muito, típico daqueles que desconhecem a vida adulta e os seus intermináveis boletos, meninos e meninas carregavam mochilas e vestiam uniformes escolares. Para minha sorte de curiosa, Gigi e Juju estavam entretidas com os mil cheiros de xixi alheio espalhado nas calçadas e, quase cúmplices, diminuíram o passo.

Uma das meninas, uma morena baixinha, com uma mecha de cabelo azul, falou que estava com fome, doida para almoçar. Queria bater um prato de arroz, feijão e ovo frito. Logo uns três, de preferência. Odeio feijão, disse um dos meninos. Prosseguiu dizendo que não gostava porque, quando era criança, na casa da avó, caiu de um pé de feijão e se machucou feio. Todos deram risada e a garota ruiva de cabelos crespos falou que sentia muito.

Como uma das cachorras resolveu que precisava depositar uma obra na calçada, tive que parar para recolher. O suporte com saquinhos biodegradáveis emperrou enquanto eu, de cócoras, tentava retirar um sem rasgar, ansiosa para seguir ouvindo o restante da conversa. Quando consegui, por fim, recolher o “presentinho”, a moçada já estava longe e eu, com as pernas doídas, voltei para casa, um tanto intrigada sobre como alguém poderia cair de um pé de feijão, exceto, talvez, se fosse chamado João.

Seriam feijões mágicos, gigantescos, verdadeiras escadas até o Céu? Teria sido o gigante a empurrar o menino de volta ao chão, responsável por sua aversão? Ou, mais provável, o menino mentiu para se justificar, não fazendo a menor ideia de como se parece um pé de feijão, porque somente o Pequeno Polegar poderia cair de um deles.

Em tempos de celulares e outros eletrônicos, não sei se pés de feijão estão entre as atividades dos discentes, mas, a julgar por esta minha recente experiência, acredito que não faria mal a ninguém uma volta às origens, a um estudo mais real. Triste perceber que, aos poucos, a humanidade vai perdendo o contato com a natureza, com o simples, com o que leva tempo para se concretizar.

Tudo bem não gostar de feijão, mas ser capaz de cair de tão pouca altura comprova que andamos voando baixo demais. Que falta, aparentemente, faz um pouco de algodão úmido para depositarmos as sementes dos nossos sonhos, da nossa imaginação, do nosso conhecimento sobre o milagre da vida.

Cinthya Nunes é jornalista, advogada, professora universitária e continua plantando grãos de feijão – /www.escriturices.com.br