Curiosamente, mas não de forma deliberada, meu texto anterior tratou da situação das inúmeras árvores exterminadas quase diariamente para dar lugar ao cinza dos prédios que vem transformando a paisagem do bairro onde moro. Por infelicidade, nessa semana passamos, na rua de casa, por episódio semelhante.
Quando nos mudamos para cá a rua, que tem apenas um quarteirão, era bem arborizada. Até frutíferas havia. Um lindo pé de abacateiro em uma das esquinas, fornecia frutos a qualquer um que se dispusesse a pegá-los. Na outra esquina, um pé de laranja florescia e frutificava, enchendo de perfume e cores o lugar.
Nesses quase 13 anos desde nos mudamos para cá, muitas árvores foram criminosamente arrancadas por quem não queria sujeira na calçada ou por outro motivo mesquinho e irresponsável qualquer. Tudo sempre feito sem autorização da Prefeitura, de forma a configurar crime ambiental. Diante da impunidade geral que vige em nosso país, as pessoas agem sem pudor, entretanto.
Há quase dois anos tivemos uma ocorrência envolvendo um coqueiro que já tinha mais de 50 anos. Embora não tenhamos conseguido agir em tempo de salvar a árvore, que era habitat natural de muitas maritacas que se deliciavam com os coquinhos maduros, não deixamos barato e, após acionarmos todos os contatos possíveis descobrimos que se tratava de uma quadrilha que recebia valores do mesmo tipo de gente imbecil para arrancar, ao arrepio da lei, árvores saudáveis.
Depois disso fizemos vários pedidos na prefeitura e, um belo dia, trouxeram outro coqueiro, já adulto, que aos poucos recupera a nossa paisagem. Tempos depois chegaram mais doze novas mudas, as quais, mesmo diante da reclamação de alguns moradores, foram plantadas em nossa ruazinha. Há dois meses, em uma madrugada, duas delas foram arrancadas, havendo, dessa vez, a suspeita de se tratar de uma pessoa sob efeito de drogas.
A maior árvore da rua, no entanto, é um ipê imenso, lindo de se ver. De fato, cresceu demais e não é a árvore mais apropriada para o lugar em que se encontra, mas está saudável e serve de apoio e morada para muitos pássaros que lá constroem seus ninhos. No entanto, nem todos veem beleza nela, pois há moradores que estão imbuídos de vê-la no chão.
Serei obrigada a concordar com isso se houver autorização dos órgãos competentes, de alguém que, com conhecimento técnico, ateste que a árvore representa risco para as casas e pessoas, mas essa não é a conclusão das pessoas que até o momento a analisaram. E assim, diante dos caminhões que chegaram para fazer o corte, corri até lá exigindo ver o laudo e a autorização de corte, o que de fato não havia.
Em um primeiro momento o pessoal se retirou, mas, no fim da tarde, já estavam de volta e lá fui eu novamente. Convoquei minha cavalaria, composta de dois amigos, sendo um deles o outro único vizinho que parece se importar de verdade. O outro estacionou o carro embaixo da árvore, impedindo o acesso de qualquer outro veículo.
Deu conversa, deu discussão, chegaram os bombeiros. Juntou gente envolta, os curiosos de sempre. Colocamos um drone para sobrevoar a árvore e registrá-la em toda sua exuberância. De acordo com os bombeiros a árvore é sadia e não pode ser retirada. A prefeitura, a despeito da alegação da moradora de que tinha autorização, negou a existência desse documento. Todo mundo foi embora. A árvore ficou, por ora.
Mais tarde li no perfil da Subprefeitura que novamente as quadrilhas de cortadores de árvores vem agindo no bairro. Eu só queria entender o ódio que algumas pessoas têm do verde, da natureza. Simplesmente não concebo. Claro que quando há risco, a coisa muda de figura. Só estamos exigindo a legalidade para o ato, se for o caso.
O que ainda alenta o coração, o que dá esperanças, em momentos assim, é ver que ainda há, por outro lado, mesmo minoria, quem se importe e se dispõe a nos dar as mãos, em verdadeiro exercício de cidadania.