Sei que o assunto é controverso, mas preciso dizer que eu me compadeço das pombas. Aparentemente elas são agora o alvo de muitas críticas e até mesmo de ódio coletivo. Há várias questões a considerar quanto à questão de saúde pública que envolve as pombas, mas também é preciso lembrar de que são seres vivos e que, como tudo que respira, lutam pela sobrevivência.
Minha história com essas aves vem de longa data. Ainda criança eu já me definira o meu lado: era uma aliada das pombas. Sempre foram delas as minhas migalhas, os meus restos de comida. Descoberto seu local de ninhos, era comum que eu lá subisse para olhar e pegar os pequenos ovinhos brancos. Quando os pequenos filhotes nasciam, eu sempre estava por perto para deles me enamorar.
Meu avô muitas vezes me perguntava se tinha ovos lá encima do forno, na parte externa, ao que eu respondia que não. Muitas foram as vezes nas quais eu os escondi, evitando que fossem quebrados para conter a população de pombas cinzas, brancas e pretas. Quando as pequenas aves emplumavam eu me dava por vitoriosa, pois ninguém mais teria coragem de fazer-lhes qualquer mal.
Acredito que muitos que agora leem esse texto irão pensar que tenho sido inconsequente, mas não serei hipócrita ou mentirosa. Não há um só lugar no qual eu esteja comendo que, havendo pombas (ou qualquer outro pássaro) por perto que eu não lhes destine pedaços de pão ou qualquer alimento que me esteja à mão. Simplesmente sou incapaz de agir de forma contrária.
Não sou, contudo, indiferente a tudo o que se diz de ruim sobre as pombas. Muito pelo contrário, antes de mais nada, busquei me informar, através de vias confiáveis, se tais aves são mesmo as vilãs da vez, propagadoras de toda espécie de doenças, “ratos de asas” ou coisa que o valha. E o que encontrei não as condena liminarmente. Muitos aspectos devem ser considerados, mas não se pode imputar às pombas muitas das mazelas que decorrem da falta de higiene da população e da ausência de políticas públicas adequadas.
Quando a sujeira impera, quando outras aves mais frágeis e predadores sucumbem pela falta de espaços verdes, as aves mais resistentes e adaptadas ao caos urbano como as pombas, acabam se multiplicando de forma desordenada. Como qualquer grupo populoso, produzem excrementos que, se não lavados, podem servir de vetores para doenças.
Claro que não me qualifico para poder opinar de forma técnica sobre o tema, mas me parece que o tem comporta, no mínimo, discussão, com direito ao contraditório. Por ora, até provas científicas em contrário, advogo para as pombas. Em verdade, parece-me que quase ninguém se compadece delas.
Símbolos de paz utilizam a imagem dessas aves marginalizadas, mas ninguém recolhe ou trata (com raríssimas exceções) daquelas que se machucam e que ficam pelas calçadas agonizando. São praticamente invisíveis. Enxotadas de quase todos os lugares, parecem, de forma que julgo injusta, serem meros estorvos, coisas que se movem debilmente.
Dias atrás eu me sentei para almoçar nas dependências de uma universidade. Notei que algumas pombas ficavam por ali, esperando os restos de comida esquecidos pelo chão. Para meu absoluto espanto vi que quase todas que ali estavam eram mutiladas ou apresentavam defeitos genéticos nos pés. Algumas não os tinha, mas somente andavam sobre tocos. Outras tinham um dos pés somente, com o outro composto por uma massa disforme.
Não sei se ficam assim por conta de linhas de cerol, por defeito genético ou por pousarem em fios de alta tensão, mas me entristece vê-las assim, capengando por um mundo indiferente e cruel. Impressionante como conseguem se equilibrar, como se locomovem ignorantes de um mundo que basicamente lhes despreza. Sinto muito por quem discorda, mas prefiro as pombas.