Acredito que já fazia mais de 8 anos que eu não me aventurava até a Bienal do Livro de São Paulo. Embora seduzida pela chance de estar cercada de uma das coisas que mais amo na vida, os preços altos dos livros me desestimularam. A minha história com esse evento, por outro lado, é curiosa.
Eu deveria ter uns 13 anos e morava em Lins quando a escola decidiu levar algumas turmas de alunos. Nem faço ideia de qual foi o critério de escolha, mas para minha desolação, não incluía a turma em que eu estava. Minha irmã Ivy, porém, com 11 anos, estava entre os sortudos.
É preciso contextualizar algumas coisas. A distância entre Lins e São Paulo é de aproximadamente 444 km e hoje, com estradas duplicadas, mantendo-se uma velocidade de segurança, sem contar com congestionamento já habitual da gigante paulista, o percurso, de carro, leva mais de quatro horas e meia. Imagine-se isso, então, de ônibus, há algumas décadas. Ou seja, sem chances de que eu pudesse ir até a Bienal de outra forma, excluída das turmas sortudas.
Sem maiores opções, restou-me pedir a minha irmã que me trouxesse algum livro legal, talvez uma novidade, sei lá. Uma vez mais lembro que não havia internet e nem mesmo celular. Tive que contar que ela escolheria alguma coisa interessante. Fã incondicional de Agatha Christie, supus que conheceria algum novo autor do mesmo estilo, mas nunca soube (e nem agora o faço kkk) esconder minha total decepção quando meu presente de consolação foi “O Exorcista”, com direito à capa assustadora.
Nunca assisti ao filme, mas para não desperdiçar o livro, eu o li e ganhei de brinde vários pesadelos, assolada pela capa e pelas imagens que minha imaginação construiu de uma menina capaz de virar o pescoço até as costas. Nunca entendi as razões pelas quais minha irmã supôs que aquele título seria a única ou melhor escolha, mas, segundo ela, todo mundo estava comprando e, enfim, naquele momento ela resolver fazer parte de todo mundo.
Quando tive a chance, já adulta de ir até a Bienal, compreendi que era fácil ficar perdida entre tantas opções. É mais livro do que qualquer pessoa pode dar conta de ler em algumas vidas, mas, ainda assim, quem vai lá e ama livros, sente a compulsão por comprar tudo o que o dinheiro e o espaço em casa permitirem. Em uma das edições da Bienal encontrei em um corredor, parado e sozinho, ninguém menos que Ariano Suassuna e naquele instante eu me senti dentro das páginas de um livro.
Neste ano, acompanhada de uma amiga igualmente leitora voraz, programei uma ida até a Bienal para prestigiar o lançamento do livro de outra amiga e, óbvio, presentear-me com alguns exemplares. Por sorte compramos os ingressos antecipadamente, pela internet, porque quem chegou lá pouco depois das 11 da manhã já ficou para o lado de fora. Em tempos tecnológicos e de redes sociais, o evento é bem mais do que uma exposição de livros, tornando-se uma experiência sensorial.
Lotado, com pessoas carregadas de livros, quase espólios de guerra de quem conseguiu entrar nos estandes das editoras mais concorridas, para as quais havia filas cujo início nem se encontrava, era difícil não sucumbir aos lançamentos nos meus gêneros preferidos. Sem qualquer oportunidade de nos sentarmos, minha amiga Marina e eu andamos por cerca de 4 horas, garimpando entre as pilhas de livros com valores promocionais e em busca de novas descobertas literárias.
Embora com internet sofrível no lugar, inclusive a 5G, ainda acho que vale a pena. Em algum lugar do meu subconsciente ainda vive uma menina que não se cansa de pensar que agora não depende mais da escolha aleatória da escola. Andando por lá, naquele domingo, estive feliz como pinto no lixo. Entendedores entenderão.