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galo

E tem histórias que, de tão inusitadas, mais parecem inventadas. Os escritores são devoradores de casos, ladrões de vivências alheias, com dois ouvidos a serviço de certa e inofensiva bisbilhotice. Ré confessa, cronista crônica, não desperdiço uma boa história, ainda mais uma que envolve animais, tema de predileção.

Foi assim que conheci a história do Galo Popó, um garnizé que se considera cachorro e dos bravos. Durante a pandemia, em um dia qualquer, ele apareceu, surgido sabe-se lá de onde, na porta de uma casa, em um condomínio residencial da cidade de Taquaritinga-SP. Sem ideia do que fazer com a ave, uma espécie de pinscher de penas, a dona da casa logo o ofereceu para o menino da casa da frente.

Acolhido de pronto pela família, o galo logo se enturmou, passando a acompanhar os cachorros da casa, como parte da matilha. Aprendeu inclusive a latir, até porque em Roma é salutar agir como um romano. Sem qualquer noção de tamanho e do perigo, arrisca um homem a homem (ou seria galo a cachorro?) com um rottweiler que leva a pior, talvez por certa piedade do complexo de Napoleão do meio-irmão.

Não bastasse isso, o inquilino de esporas ainda é folgado e se refestela no sofá da sala, deitado para o descanso dos justos que podem dormir no meio da tarde. E enquanto os humanos trabalham, o galinho fica na frente do ar-condicionado, todo pimpão, só fiscalizando, porque alguém tem que fazer o trabalho pesado, no fim das contas.

Incorporado à rotina familiar, vivendo vida de rei há mais de três anos, Popó até chegou a ir dormir na cama com o casal e os cachorros que por lá se aboletam, mas foi sumariamente expulso quando começou o toque da alvorada, cantando/gritando às três horas da madrugada. Como tudo tem um limite, o galinho se recolhe voluntariamente em um viveiro instalado na lavanderia, tão logo a noite chega.

Como medida preventiva a evitar sua desabalada carreira e serenata noturna, a gaiola precisa ser fechada e coberta para que a noite dure mais algumas horas. Aquele que se levanta primeiro tem a incumbência de soltar o galo que, dessa hora em diante, está liberado para cantar o quanto quiser.

Minha fonte para esse caso é a mais fidedigna possível, já que o atual senhorio ou talvez pai do penosinho foi quem me contou. E se já não fosse boa, a história ficou ainda mais insólita quando ouvi dizer dos hábitos alimentares do galinho Popó. Muito embora a família tenha até caçado baratas e outros insetos para incrementar o menu da ave, e, diga-se de passagem, creio que os pets devam se pegar de tapas para uma vaga com um pessoal assim tão incrível, Popó simplesmente esnobou o prato do dia.

Desconfio fortemente, cá entre nós, que talvez esse galo tenha transtorno de personalidade ou quem sabe possa mesmo ser um alienígena disfarçado para testar a convivência entre humanos, porque o bicho gosta mesmo é de comer queijo, macarrão e, pasmem: frango!

Acalmem-se leitores! Pelo que entendi ninguém ofereceu deliberadamente. Foi o danado que, leviano, apropriou-se da comida dos cachorros. Agora não tem mais volta, porque se tornou o prato preferido e não há quem o impeça, já que na corrida ele dá pequenos voos. Registro que achei essa história incrível e, se não tivesse visto foto do galo esparramado no sofá, dormindo de pernas esticadas, talvez pensasse ser exagero, mas no mundo animal tudo pode, ainda mais quando uma ave incrível encontra uma família do mesmo calibre.

E viva o Popó, o garnizé canibal.

Cinthya Nunes é jornalista, advogada, professora universitária e ama boas histórias com boas pessoas – Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo./ www.escriturices.com.br