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vento

Quem escreve nunca sabe ao certo como e se irá tocar as emoções de outras pessoas. O desejo da grande maioria dos escritores, penso eu, é que seus textos sejam lidos. Mesmo que o ato de escrever, em si, seja solitário e tenha por destinatário inicial o próprio escritor, não há escrita que faça sentido na ausência de leitores.

Admito que não me lembro mais de todos os textos que escrevi durante esses mais de vinte e três anos como cronista, mas guardo no melhor lugar de mim as mensagens que recebi ao longo do mesmo período, enviadas por pessoas que os leram.

Elogios, sugestões ou críticas, tudo foi e é bem-vindo. Enquanto escrevo, digitando e apagando muitas frases que não me parecem adequadas, penso na queda dessa parede de papel que me separa, aos meus pensamentos, daqueles que me acompanham ou que chegaram aqui, até este texto, por puro acaso.

Posso afirmar que amizades nasceram a partir desse ponto de contato. Conheci pessoas incríveis e tenho absoluta certeza de que recebi muito mais do que ofereci. Tive a alegria de manter alguns contatos por vários anos, enquanto outros se resumiram a uma única mensagem. Assim, no primeiro caso, vez ou outra, tenho o privilégio de conhecer pessoalmente alguns leitores.

E foi assim que se deu recentemente. De férias do trabalho e passando alguns dias na cidade de Lins, na casa dos meus pais, vivenciei um pouco mais dessa alegria. Lá no Café da Emília, como meu pai se refere ao local, no calçadão do centro da cidade, sentei-me para um bate-papo com um casal incrível, lindos de todas as formas como se deve ser. Ouvi histórias novas, absorvidas como tesouros para textos futuros, ganhei sorrisos, abraços e uma geleia de mexerica que tem um quê de divino, já devidamente saboreada com torrada.

No mesmo dia, um pouco mais tarde, foi conhecer um amigo com quem já falo ao telefone há mais de um ano. Embora eu tenha ficado com muito medo da cachorra-bezerro que ele tem como cão de guarda, foram momentos muito ímpares, significativos. Enquanto alguns de seus muito relógios de parede, lindamente preservados, batiam as horas, entre a saída furtiva de um cuco curioso, eu pensava em como a vida tem linhas e entrelinhas misteriosas.

Não vou mencionar o nome das pessoas aqui, até porque sequer lhes pedi permissão, mas gostei muito de ouvir as percepções da minha escrita através de outros olhos. Nessas décadas de crônicas tenho escrito sobre absolutamente tudo que me inspire, mas também sobre as experiências que acho dignas de serem compartilhadas. Só que nunca sei como minhas palavras chegam até o leitor, essa criatura mítica, misteriosa, que eu nem decifro, mas que sempre me devora.

Tantas vezes fiz desse espaço um divã, fosse para dividir alegrias ou tristezas. Nunca planejei me tornar uma cronista, entretanto. Apenas aconteceu, como tantas coisas nos acontecem, por destino ou pelo acaso. Mas o que tenho aprendido com tudo isso supera em muito o que escrevo. Aprendi que a generosidade e a gentileza são virtudes que precisam ser exercitadas, pois é imperioso devolver o bem que se recebe. A vida é um tanto imenso de trocas, de descobertas. Em meio às partidas há tantas chegadas, cada uma acontecendo em um porto distinto de nós.

De onde estou agora, vejo ao longe os barcos partindo e o faço com os olhos marejados pela saudade que fica. Do mesmo lugar, para dar sentido aos meus dias, vislumbro aqueles que se aproximam do cais e a todos eles eu chamo de amigos.

Cinthya Nunes é jornalista, advogada, professora universitária e ré confessa –Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo./www.escriturices.com.br