Antigamente era coisa importante a gente saber qual o talher adequado para se comer determinado alimento ou em que copo tomar cada tipo de bebida. Neste quesito sempre fui uma negação e, creio, a essa altura da vida, devo continuar ignorando tudo isso lindamente. Talvez em certos meios sociais esse conhecimento tenha relevo, mas sendo franca, não me importa muito.
Por outro lado, viver em sociedade requer a adoção de algumas convenções, de regras mínimas para uma convivência civilizada. Do jeito que as coisas são, pode ser que um dia até mesmo pequenas gentilezas como pedir licença e agradecimentos fiquem fora de moda, mas, por ora, ainda demonstram educação e habilidade social.
Evolui a tecnologia e evoluem também os costumes. Sejamos analógicos ou digitais, precisamos nos adaptar e, com os novos meios de comunicação surge também a necessidade de observarmos regras básicas que nos permitam transitar e interagir sem passarmos por situações constrangedoras e/ou comprometedoras.
Como professora universitária parte de minhas aulas ocorre via tele presencial e embora, vez ou outra, algum aluno esqueça o microfone ligado, em geral é algo resolvido facilmente. Alguns episódios foram inesquecíveis, para azar dos alunos. Em uma das aulas da turma da noite, sei lá eu por qual razão, a câmera de um aluno se abriu e toda sala pode vê-lo tomando banho, obviamente nu. Avisei o mais rápido que pude, quando ouvi um grito e a tela ficando escura segundos depois. O aluno em questão nunca mais foi visto na tela do meu computador.
Mais recentemente, em uma sexta-feira, final de aula, perto das 22h, estou nas considerações derradeiras quando escuto uma vozinha sussurrando: “ei, professora”. Depois de me certificar de não estar ouvindo vozes de outros mundos, notei que um dos alunos estava com o microfone aberto e percebi que uma criança com cerca de 6 ou 7 anos é quem falava bem baixinho. Pena o pai não estar por perto para ouvir o doce infante me dizer que eu era muito chata. Teria sido bem mais legal ver a reação dele. Mas enfim, agradeci a gentileza e desejei boa noite ao fedelho mal-educado.
Sei que a internet está cheia de exemplos de “escorregões” virtuais, mas ainda assim, mesmo cientes, corremos todos o risco de microfones ou câmeras abertas em momentos indevidos. E foi assim que, dias atrás, participando de um seminário internacional, transmitido para vários países, uma das participantes ficou durante mais de meia hora falando ao telefone com uma amiga, frisando a todo instante que se tratava de algo muito confidencial e que ela não deveria falar com ninguém em hipótese alguma. De fato, era um babado e tanto, cá entre nós e mais uma centena e meia de ouvintes.
Assistindo a uma aula, o professor já estava nervoso com alguns microfones abertos enquanto crianças, cachorros e televisões inundavam a transmissão com todo tipo de sons, mas nada se comparou ao sonoro pum que uma das participantes soltou, enquanto se ouvia o marido dizendo, ao fundo, que o cheiro estava terrível. Foi praticamente impossível continuar a aula sem rir, sobretudo porque a pobre mulher sequer entendeu ser o mote das risadas.
Fato é que enquanto vivemos online, também precisamos aprender a fazer isso de modo a preservarmos nossa intimidade e nossa dignidade. Sérias questões legais podem surgir, com consequências indesejadas. Não se trata assim de onde colocar o mouse ou de escolher o melhor fundo para nossa tela. Descemos das árvores, usamos talheres finos, mas ainda engatinhamos sobre como nos comportarmos diante das telas que nos colocam dentro das casas de outras pessoas. Nunca estivemos tão perto, nem tão longes, uns dos outros.