Desde o começo da pandemia tenho lido tantas reflexões sobre as muitas mudanças que ela trouxe à vida das pessoas. Eu mesma, em outros momentos, já arrisquei algumas linhas sobre o tema, algumas mais leves, mais otimistas, outras nem tanto, eis que tomadas pela emoção das irreparáveis perdas.
Ainda que o vírus tenha alterado, ao meu sentir, para sempre, a vida de todos nós, no mundo inteiro, em tantos sensíveis aspectos, acredito que as mudanças tenham impactos diferentes para cada um, conforme tenham sido especialmente afetados. Há lutos a serem vividos e a sobreviver, empregos a se reconquistar, sonhos a acharem par. Cada qual tem um caminho novo a percorrer, de um jeito ou de outro.
Muitas vezes eu me surpreendo com a sensação tola de que tudo isso vai passar em um estalar de dedos, mas é uma ilusão fugaz. Lembro-me do antes, da liberdade que tínhamos de simplesmente estar ao lado daqueles que nos são caros, amigos e família. Sinto tanta saudade da leveza dos encontros, das risadas e das pessoas que essa doença nos roubou. Meus olhos ficam mareados facilmente, repletos das águas dos rios que, outrora subterrâneos, agora afloram em mim.
Há tempos não chorava, ao menos não no tempo do antes. As minhas lágrimas ficavam restritas às grandes dores. Agora são indóceis e me lavam a face por qualquer motivo, essencialmente por qualquer lembrança. Chorei a cada partida precoce, a cada amigo ou familiar que nunca mais verei. Choro de alegria sempre que sei de uma recuperação, quando a vida ganha nova chance.
Perdi algumas travas, igualmente. Dizer eu te amo era algo reservado ao meu amor e, mais timidamente, a minha família. A pandemia me inundou de um estoque infinito dessas palavras. Compreendi, assim, o poder imenso de dizer “eu te amo” a alguém. Comecei sem me dar conta, no entanto, meio sem graça no início, como se fosse estranho dizer que se ama um amigo, como se eu pudesse ser mal-entendida ou como se o uso cotidiano dessa expressão a tornasse menos importante, menos significativa, mais vulgar.
Não há tempo a perder quando se trata de amor. Em verdade, nunca houve. A pandemia, nesse sentido, apenas tornou isso mais claro. Mais do que somente dizer, eu realmente sinto o amor que transformo em palavras e noto que ao reagirem a elas, as pessoas também me transformam. Essa troca de energia entre pessoas que tem vínculos de amor é quase palpável e sem dúvida transformadora.
As mais tocantes recordações que tenho da vida estão relacionadas às declarações de amor que recebi e estou certa de que, ao me despedir desse mundo, no tempo de Deus, se algo puder ser levado daqui, serão elas que carregarei comigo e que me tornarão espírito e eternidade. O amor é de fato a força motriz mais poderosa que existe, que se multiplica ao se dividir, que se acumula quando se distribui.
Por certo que palavras esvaídas de sentimento nada são e que o amor transcende às palavras, mas há uma energia inexplicável que se apodera desse verbo, como se fosse semente lançada ao vento quando é dita. Amor, dito ou sentido, não é bicho que se aprisiona, é ave que tem que voar. Se há amor, espalhe-o por aí. Diga eu te amo aos seus pais, aos seus filhos, irmãos, amigos e aos seus animais de estimação. Amor nunca é demais, só de menos.
Nada está ao nosso controle, nem nunca esteve. Estamos por aqui, ocupando espaços que sequer nos pertencem. Tudo vai passar, pelo bem ou pelo mal, mas todo amor que vivenciarmos fará história, deixará rastros, amenizará solidões, será lembrança quando chegar a nossa vez de partir. Diga mais “eu te amo”, sem moderação.