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mascaras

— Quer dizer que agora não precisa mais usar máscara? Liberou geral?

­—Não é bem isso. Não precisa mais em ambientes abertos e, nos locais fechados, só no transporte público e locais de atendimento à saúde, tipo hospital, essas coisas.

—Até que é bom isso né? Ou não é? Eu nem sei direito se fico feliz ou chateado.

—Ué, chateado por quê? Não é bom respirar livremente outra vez, sem aquele treco sufocante? Eu pelo menos estou comemorando.

—Então, nesse ponto de respirar melhor eu concordo. E para quem usa óculos, como eu, usar máscara ainda é pior. Tem hora que não se me protejo do vírus ou se enxergo. Mas sabe, eu meio que me acostumei já. Não sei se tenho confiança mais em ficar com a cara limpa na frente de todo mundo, de estranhos. Parece até que estou pelado.

—Nunca tinha pensado nisso! Tem gente que trabalha comigo há um ano e que nunca vi a cara, acredita? A Lú, funcionária nova da recepção, por exemplo. Nunca tirava a máscara na frente de ninguém. Todo mundo apostava que ela era dentuça, ou banguela. Alguma coisa errada devia ter.
—E ela era?

—Era o quê?

—Dentuça? Banguela?

—Nada! Tinha dentes perfeitos. Uma boca linda. Maravilhosa. Mas depois que tirou a máscara uma vez, não conseguiu mais trabalhar em paz, a coitada. Não aguentou o assédio. Pediu demissão e, pelo que o pessoal comentou, não quer mais ficar sem máscara na frente de estranhos.

—Sabe que eu tenho um pouco de medo de ficar sem máscara em público? Acho que já me acostumei a mostrar a língua em protesto, protegido pela máscara. É bem terapêutico. Certeza que já salvou meu emprego e até meu casamento. Vai que eu esqueço que estou sem máscara?

—É cara, vai ter que se adaptar. As coisas estão mudando. Daqui a pouco as pessoas vão querer abraçar de novo e até dar três beijinhos no rosto cada vez que se encontrarem. Já pensou na quantidade de bactérias? E quem garante que não tem outro vírus aí?

—Lá em casa as coisas vão ficar meio difíceis agora com isso de não precisar mais de máscaras. Minha filha fez coleção de máscaras de pano, de desenhos diferentes e minha mulher, com medo da menina ficar doente, comprou umas dez caixas de máscaras descartáveis, daquelas ferradonas, que protegem até do vírus gama.

—Que diabo de vírus gama é esse? Nem nunca ouvi falar. Só sei de variante delta e omicron.

—Ah, sei lá. Minha mulher que falou. Parece que é a cruza desses dois aí. Só sei que paguei uma fortuna para ela comprar. Mas agora quero só ver o que a gente vai fazer com tanta máscara, se nem precisa usar mais. Ela fala que é para nossa segurança, que lá em casa vamos continuar usando.

—Cara, já te expliquei que não é bem assim. Em alguns lugares ainda será obrigatório.

—Eu entendi. Só não me sinto pronto. Tenho kits de máscaras na minha mochila, no carro, no escritório. Tenho até umas mais bonitas, para locais especiais. Sem dizer que fiquei bem melhor com elas. Parece que as pessoas passaram a gostar mais de mim depois que passamos a usar máscaras. Acho que elas me dão sorte. Eu e você, por exemplo, nunca tínhamos conversado tanto antes da pandemia.

—Hum...Como você tocou no assunto, faz tempo que queria te dizer uma coisa: seus dentes são muito amarelos e você tem um bafo medonho. No seu caso, acho mesmo melhor continuar usando máscara, pode apostar.

Cinthya Nunes é jornalista, advogada, professora universitária, odeia máscaras, mas acha que a vida às vezes é bem mais fácil com elas – Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo./www.escriturices.com.br